domingo, 22 de agosto de 2010

Quando uma ótima banda se torna uma péssima influência

Radiohead: experimentais que geraram seguidores caretas 
Algumas filosofias orientais acreditam que toda ação carrega em si uma carga de bem e de mal. É um tipo de pensamento que busca enxergar por trás das aparências e dos efeitos imediatos de um ato, analisando desde as reais intenções existentes ali até suas conseqüências a longo prazo e a longas distâncias. De tão intrincada e ampla, essa visão holística de mundo chega a apostar que o bater das asas de uma borboleta no Japão pode influenciar a vida de um cidadão no interior do Mato Grosso. Ou seja, por mais que a nossa boa intenção seja apenas a de conter um vazamento de um cano d’água, podemos, sem saber, estar ajudando a romper as comportas de uma grande represa.

A princípio, um assunto tão místico como esse estaria a léguas de distância do cético e materialista rock’n’roll. Mas, analisando um pouco a história do gênero, notamos que o princípio de bem e mal em uma mesma ação também se aplica ao estilo musical criado por Chuck, Elvis e Richards nos anos 50. E isso faz com que bandas excelentes, algumas até mesmo responsáveis pela ruptura de barreiras em determinadas épocas, sejam exatamente os entraves de outros momentos, por meio de uma influência nefasta em grupos absolutamente sem talento.

Os discípulos de Rolling Stones se ativeram à atitude cafajeste
da banda, em detrimento da boa música
O Rolling Stones é um desses exemplos de banda legendária, que, em contrapartida a sua inegável competência musical, ajudou a criar alguns dos piores monstros - no mau sentido - do rock. Basta ouvir vários grupos de hard rock e glam dos anos 70 e “rockões cafajestes” dos 80’s, que, inspirados pela atitude “bad boy” e o lado pesado da banda de Mick Jagger e Keith Richards, conseguiram a façanha de tornar o rock’n’roll um estilo quase... brega. No Brasil, muitas bandas seguiram essa tendência, como os setentistas do Tutti-Frutti e do Made in Brazil e os oitentistas do Barão Vermelho e do Garotos da Rua, alguns deles fazendo sua música até com certa competência. Mas, no geral, o resultado das bandas influenciadas por Stones é aquém do aceitável, com um rock previsível, de letras quase infantis de tão mal escritas, e componentes vestidos com jaqueta de couro preto e mullets de causar náusea em qualquer pessoa minimamente ligada em estética.

Uma outra excelente banda que gerou filhotes indesejáveis é o Van Halen. Liderada por Eddie Van Halen, um gênio da guitarra tanto em técnica quanto em bom gosto, o VH acabou ajudando a disseminar o que se convencionou chamar de Metal Farofa, com grupos formados por componentes muito ligados ao virtuosismo (e ao visual bizarro de roupas coloridas e cabelos com laquê!!!), mas pouco inspirados. Quer exemplos? Mr. Big, Tesla, Poison, Extreme, White Lion e por aí vai. A cena formada por bandas “poser” e guitarristas super técnicos – apelidados de “punheteiros” – se tornou tão popularmente grotesca no final dos anos 80 e começo dos 90’s, que o próprio Van Halen saiu com filme queimado da história, numa daquelas injustiças que o futuro há de reverter.

Mas a lista de bandas excelentes que serviram de influência para péssimos grupos não pára por aí. De cabeça, posso lembrar de U2 e sua escola de bandas que tentavam ser, ao mesmo tempo, pop e engajadas. Na maioria das vezes, o que se via nos aspirantes a U2 era um discurso político baseado em argumentos fracos e uma música pobre, longe da classe e força propagada pela turma de Bono Vox e The Edge. Outra banda excelente - quase revolucionária - que gerou rebentos chatérrimos é o Radiohead. Por algum motivo, seus filhotes optaram por deixar de lado a inteligência e o lado experimental da banda de Thom Yorke, para se apegar a uma música melosa e arrastada. Talvez o exemplo de rebento do Radiohead (e do U2, também) mais bem sucedido – e chato, na opinião deste que vos escreve – seja a banda inglesa Coldplay. Mas há outros seguidores meio pentelhos que vão desde Howie Day até (o competente, mas meio “over”) Muse.

No Brasil, dois grupos muito bons exerceram péssima influência sobre suas crias: Chico Science & Nação Zumbi e Los Hermanos. Enquanto o primeiro foi responsável pela proliferação de diversos grupos pseudo-folclóricos nas décadas de 90 e 00, apegados superficialmente a tambores e supostas raízes brasileiras, a banda dos barbudos cariocas fez com que um monte de gente achasse que a fórmula da boa música era simplesmente resgatar velhos discos de MPB dos pais e tentar escrever como Chico Buarque. Obviamente, a esmagadora massa de bandas seguidoras dos Los Hermanos acabaram com letras falsamente poéticas e harmonias e arranjos metidos a rebuscados e abrasileirados. O resultado, na maioria das vezes, é uma verdadeira lástima.

Pearl Jam: hors-concours na influência a bandas péssimas
Por último, mas não menos importante, talvez a banda hors-concours em matéria de ser uma péssima influência para as demais é o Pearl Jam. O lado messiânico e pop de Eddie Vedder e seus asseclas criou alguns dos conjuntos mais insuportáveis da história do rock. Basta lembrar de bandas como Nickelback, Creed, Nixon, Hootie & the Blowfish e tantas outras que acharam que bastava imitar o vocal de pato rouco de Eddie Vedder para se fazer sucesso. No meio disso, só uma banda se salvou: o Stone Temple Pilots, que, de clone do PJ, acabou partindo para outras searas e se tornando uma ótima banda.

Num caminho oposto à popularidade, são as bandas mais obscuras que, geralmente, acabam sendo as melhores influências na história do rock. E é por isso que artistas como Muddy Waters, Link Wray, Buddy Holly, Velvet Underground, New York Dolls, Stooges ou mesmo os alemães do Can acabaram sendo as grandes referências para o surgimento de bandas excelentes e até mesmo de movimentos musicais. Uma das explicações para isso talvez seja o fato de os artistas obscuros só serem procurados por gente mais ligada em música, que está tentando escapar das fórmulas fáceis do sucesso.

Por outro lado, jogar a receita de se fazer uma boa banda para esse lado alternativo seria muito simplista. E, convenhamos, muita coisa boa já foi feita em cima de Beatles, Bob Dylan, Talking Heads e tantos outros medalhões do rock - os Stones mesmos foram quase xerocados pelo Primal Scream no começo de carreira -, enquanto muita porcaria já foi influenciada por bandas underground como Pixies e Pavement.

Na verdade, talvez a resposta para essa questão da influência maléfica de bandas boas esteja num plano mais esotérico, mesmo. De alguma forma, em determinadas épocas, alguns artistas excelentes chamam a atenção para a forma como fazem música e passam a servir de matriz para as bandas ruins - as quais, por sua vez, acreditam serem capazes de refazer facilmente aquela fórmula de sucesso. Quase como se fosse um carma, essas bandas ruins vêm trazer à prova o benefício causado à música pelos bons artistas em sua carreira pregressa, numa espécie de balanceamento entre o que seria considerado bem e mal em uma mesma ação.

37 comentários:

  1. Pinduca, como sempre lúcido e contundente. É isso aí.

    Só acrescentaria o Led Zeppelin na lista também. Ah, e o Legião que rendeu bandas medonhas nos 80. Acho também que o R&B em geral só gerou porcaria.

    Abrax

    ResponderExcluir
  2. Cara, o seu texto falou quase tudo. Concordo em todos os aspectos ( talvez nem tanto sobre o STP, que tem uma música xerocada do PJ , 'plush' mas tem composições completamente diferentes da matriz Jam - em minha opinião, claro) e pricipalmente, pelo fato de falar algo que eu reclamo a anos: O COLDPLAY parece que imita ou segue um aspecto - menor - do Radiohead, mais precisamente do OK computer... e nínguem falava isto até agora.

    ResponderExcluir
  3. e os craques da musica mundial como Tears for Fears e o nosso grandioso Paulinho Pedra Azul influenciaram quem ?

    ResponderExcluir
  4. Grande Pinduca, parabéns pelo texto. Concordo com o Renato, só faltou o Led e eu acrescentaria o Michael Jackson, que passou pela mutação de se tornar o pior cover possível de si mesmo.

    ResponderExcluir
  5. Tô com vergonha de admitir, mas eu adorava quando rolava aquelas bandas de metal diluído nas festnhas. Sério; era divertido ver os garotos empunhando suas guitarras imaginárias(rs). Sabe, Carlos Pinduca, também amo Stone Temple Pilots; na minha modesta opinião o Scoth tem uma das melhores vozes do rock in roll!!!!!
    por: Leocádia Pinto.

    ResponderExcluir
  6. Muito boa a matéria!!! Arrasou, é isso que nós precisamos, de críticas levanta poiera!!!

    Estava inspirado nessa!!!

    ResponderExcluir
  7. Putz! Achei que você tinha desistido de escrever no blog meu caro. É sempre bom ler os teus escritos. Gostei muito desse post, e concordo plenamente contigo em vários pontos do texto, porém, não se esqueça que, atrás do sucesso de algumas bandas iluminadas têm sempre uma geração de idiotas que sempre fariam melhor o papel de ouvintes do que o de músicos. Mas quem somos nós pra impedi-los, não é?

    Grande abraço e continue com o blog! É uma das únicas coisas que ainda consigo ler sobre música.

    Marcelo Rodrigues (Marcelo Bopp) ex-guitarrista da Superquadra, BSB-H, Detrito, etc..

    ResponderExcluir
  8. Parabéns pelo texto, Pinduca. Acho que foi um dos melhores publicado neste espaço. Muito boas as associações entre Stones e seus seguidores. Radiohead e Los Hermanos também são excelentes exemplos. Eu citaria também Raimundos. Depois do primeiro disco deles, veio aquela enxurrada de bandas de rock "regional", tipo Virgulóides. Aquilo era uma desgraça. Abs.

    ResponderExcluir
  9. Primoroso. Sensacional. De uma lucidez ímpar. Parabéns pelo texto, amoreco. No rock, como na natureza, sempre valeu a máxima de Lavoisier: nada se cria, tudo se transforma. Ou melhor: fórmulas consagradas sempre geraram genéricos meio vagabundos e não confiáveis. Agora, me diga aí, do alto da sua vasta experiência musical quem gerou estes furúnculos do RESTART??????

    ResponderExcluir
  10. Genial. Faltaram os Strokes e o estrago que as bandinhas da "renovação do rock" fizeram (Jet, Vines, Artic Monkeys...).

    ResponderExcluir
  11. Ah,Naja Najito, esqueci de citar que gosto da cópia do F.Mercury - Mika.
    Gosto do clone dos Bee Gees - Scissor Sisters.
    Isso sem falar na imitadora suprema de todas as cantoras pop(até mesmo artista plástico: AndY W.) - Lady Gaga!
    Sei que acabei de perder dez pts. contigo com esse gosto musical caótico, mas fazer o quê? EU SOU ASSIM!!!!!
    Leocádia Garibaldi

    ResponderExcluir
  12. Curti o texto. Tem também o Bush, que é uma copia deslavada do Nirvana.

    Mas tem influências que deram certo, como o White Stripes (Led Zeppelin).

    Voce ja ouviu Wolfmother? A banda parece uma mistureba de Hendrix, Black Sabbath, The Who e Led Zeppelin. É de 2009. Muita gente achou estranho, mas eu curti.

    O Stones é parecido, às vezes, com TREX. Ou seria o contrário?

    ResponderExcluir
  13. Muito bom o post. O Coldplay é isso mesmo: uma banda chata. Mas tem alguns hits bons. Pinduca, você poderia fazer uma matéria sobre bandas importantes que não geraram filhotes. O Luma tem uma teoria de que os Smiths não influenciaram ninguém (musicalmente falando), apesar de toda sua importância.

    ResponderExcluir
  14. Pinduca, tava ouvindo "Encarando a face do mal" aqui e me lembrei que queria te perguntar uma coisa há tempos. O que vc fala em determinado momento é "Eu quero uma agenda" ? Hehehehe

    Abs

    ResponderExcluir
  15. Pinduca! Descobri agora o teu Blog. Parabéns pelo texto. Discordo aqui e ali de algumas referencias mas é uma questão de gosto e isso é dificil discutir com frieza :)
    O teu texto lembrou-me um que eu escrevi há tempos atrás (http://1canto.blogspot.com/2007/12/police-se-reformou.html).
    Espero que não te importes que eu linke o teu blog. Abraços!

    ResponderExcluir
  16. Olá, descobri a sua reflexão no blogblogs e vou na onda da maioria aqui e dizer que o post é ótimo!Parabéns!

    Por outro lado, como a Débora comentou, o que nos resta para ouvir hoje é Lavoisier!

    Desse modo, é possível argumentar que o mercado das celebridades está aí (ops, estendi a retórica, rs), é só descobrir o que "dá ibope" e vc tá na mídia, ou seja, não importa se o trabalho é bo ou ruim, até porque, apesar de estarmos na era da informação, muita gente não tem alcance para entender a arte com qualidade. É daí que vem a fama das mulheres frutas e por aí vai...

    Mas, de qq forma, valeu por defender a causa dos eruditos modernos!

    Cheers!

    ResponderExcluir
  17. Muito bom texto, concordei com muita coisa... Foi a única coisa útil que li hoje hasuahisausas

    Ganhou um seguidor! =D

    ResponderExcluir
  18. cadê vc, Pin?????
    por: Leocádia Joana

    ResponderExcluir
  19. Puxa vida, certas descobertas não têm preço!

    Estava postando no meu twitter sobre a saudade que tenho do Maskavo Roots e outras bandas sensacionais do selo Banguela, o que me fez escrever "Banguela Records" no google e me deparar com seu sensacional Blog!

    POsso dizer que me dá orgulho ter ouvido essas bandas no início da minha adolescência e ser fã até hoje.
    Brigadíssimo pelo post sobre os tempos de Banguela, foi sensacional ter a sensação de viver "de perto" aquela história. Inspirador!

    Estou acompanhandoseu blog! Espero que os posts não parem por aí!

    Forte abraço!

    ResponderExcluir
  20. Fala Carlos!

    Tudo bem cara? Há quanto tempo!!

    Entrei em contato com o Txotxa um dia desses e como não podia deixar de ser pintou saudades dos tempos de Maristão, do pessoal da música, dos shows no recreio e do Maskavo Roots é claro! Aí fui então procurar alguma coisa do 1º disco do Maskavo Roots (que acho do c***lho até hoje) e sem querer descobri esse seu cantinho aqui, que aliás já está nos meus favoritos! Gostei muito dos textos do blog e da dinâmica dos comentários, sempre enriquecendo os assuntos.

    Achei muito interessante esse post, apesar de eu assumidamente curtir um rock/metal farofa até hoje, e achar que teve muitas coisas legais dentro da farofa, mesmo que seja no aspecto técnico/guitarrístico! Mas como você bem falou, existe o bem e o mal em tudo, e não podia ser diferente quanto o assunto é música.

    Outro post que curti foi o do Bob Marley! Me fez ter vontade de ouvir mais atentamente não só os hits dele, mas também as outras músicas menos comentadas. E quanto ao poder das músicas do Bob, esse vídeo que me mandaram mostra que isso é um assunto que vai muito além da nossa vã filosofia (http://www.youtube.com/watch?v=Gd5yN43TqCk).

    Espero que novos post apareçam em breve, e que você continue escrevendo nessa forma pessoal e descontraída, como um bom bate-papo entre amigos deve ser!

    Desculpe o longo comentário!

    Grande abraço!
    Christian

    ResponderExcluir
  21. FELIZ NATAL, meu blogueiro sumido!!!!! :]

    ResponderExcluir
  22. Pinduca, sem querer pressionar mas já pressionando, já tá passando da hora do primeiro post de 2011. Estamos sentindo falta!

    Abraço

    ResponderExcluir
  23. Realmente pinduca esta tudo aii msm .
    vergonha de admitiir mas semprii gostei de nicklbeck mas sempri tive en consiêncii qii ela imitava o vocal do pato roucoo ii tube been rs' . maas vsê realmnte sabii tudo sobre o asunto .

    ResponderExcluir
  24. Cade vc Pinduca!!!!???? Bota pra frente esse blog cara!! Abração

    ResponderExcluir
  25. Pinduca, querida, mas é que jamais. Não pense que se vai ver livre assim de mim...Eu amo os seus comentários!
    Beijos tesudos, directamente de Horsens, Dinamarca, para você!

    ResponderExcluir
  26. OI, LEGAL O BLOG CURTINDO MUITO BLZ. ME ADICIONA NO SKYPE: ZENASJR31
    OU LIGA, ENVIA MENSAGEM PARA MEU TIM: 041 92 8119 1282

    ResponderExcluir
  27. Muito obrigado pelo teu simpático comentário! Obrigado mesmo! Em breve voltarei!
    Entretanto beijinhos doces com muito carinho e ternura!
    :))

    ResponderExcluir
  28. É sempre muito perigoso, sobretudo na arte, trabalhar sob influência direta de outra obra.
    Cadinho RoCo

    ResponderExcluir
  29. Como um artigo tão bem escrito como esse pode ser o último do blog?? Cadê esse grande blogueiro que não escreve mais??!!

    Abraços!

    ResponderExcluir