segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Observatório da Imprensa (Musical)















Ontem, fiquei incomodado ao me deparar com a revista dominical encartada no jornal O Globo. A matéria principal tratava dos 40 anos do álbum Abbey Road, dos Beatles, com a capa trazendo a seguinte manchete: “Clube da Esquina - nos 40 anos de ‘Abbey Road’, último e MELHOR disco dos Beatles, o culto à capa mais reproduzida da História, em discos, filmes, clipes, anúncios e, claro, revistas”. O que mexeu com os meus brios foi a afirmação, ali na capa, sobre a supremacia do último álbum gravado pelos Beatles em relação aos anteriores. Ora, quem acompanha um pouco as publicações especializadas em música sabe que não existe consenso sobre qual o melhor disco dos quatro rapazes de Liverpool, nem mesmo em relação ao melhor álbum da história da música pop.

Neste tempo em que acompanho as sempre questionáveis eleições de melhor álbum da história, promovidas por veículos especializados (Rolling Stone, MOJO, UNCUT, NME, MTV, etc), já vi vários discos ocupando o alto do pódio: Sgt. Pepper’s Lonely Heart Club Band e Revolver, dos Beatles; Pet Sounds, do Beach Boys, What’s Going On, do Marvin Gaye e até Exile on Main St., dos Rolling Stones. Sinceramente, não me recordo de ter visto Abbey Road levantando o caneco de melhor álbum (nem da História nem dos Beatles).

Resolvi dar, então, uma lida na matéria, para ver se encontrava uma justificativa para aquela afirmação contida na capa da revista. O que achei foi um texto - pouco informativo, diga-se - sobre a parte gráfica do álbum Abbey Road, assinado pelo designer Felipe Taborda, acompanhado de um box, no qual o jornalista musical Antônio Carlos Miguel fala sobre a importância do último disco dos Beatles e sua gestação a partir de divergência musicais e de uma disputa de egos entre John Lennon e Paul McCartney. O experiente crítico do O Globo começa o texto exatamente com a frase: MELHOR DISCO DOS BEATLES, Abbey Road prova que a arte pode se beneficiar de tensões” (...).

Pelo que conheço (apenas como leitor) de jornalismo cultural, a crítica é o espaço mais aberto para a expressão de opinião do jornalista. Mesmo assim, acredito que seja perigoso emitir uma opinião tão contundente sobre uma obra que já se tornou clássica - e na qual, como disse, não há consenso sobre a superioridade de um disco em relação aos outros. Numa comparação grosseira, é como se um crítico de arte dissesse que a Mona Lisa é o melhor quadro de Leonardo da Vinci. Bem, você pode dizer que La Gioconda é a obra mais popular, a mais enigmática, sei lá, mas dizer que é a MELHOR soa bem esquisito.

Pior ainda é o editor da revista reproduzir essa linha opinativa num espaço não reservado para isso, que é a capa da publicação. Aí a coisa degringola de vez, pois o leitor menos informado não tem nem como “se defender” desse juízo de valor. A sorte é que música não é algo levado muito a sério e deslizes (ou desleixos) como esse não cortam a cabeça de ninguém.

PS: Para completar o meu estranhamento com grandes veículos da comunicação, hoje tive o desprazer de ler na capa da Folha de São Paulo a seguinte chamada: 94% acham que os TEENS de hoje bebem demais. Na boa, não sou nenhum defensor fervoroso e purista da Língua Portuguesa, mas por que a opção de trocar a palavra “adolescentes” por TEENS? Poderia ser problema de espaço, mas olhando para a página, não me parece ser isso. Talvez o editor da capa não quisesse repetir a palavra jovens, que já aparece em uma chamada anterior. Mas, para mim, nada justifica colocar a palavra TEENS como sinônimo de adolescentes ou jovens na capa de um jornal de grande circulação.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Hora de olhar para frente












A presença de bandas candangas históricas na escalação do último Porão do Rock jogou luz novamente em um rótulo musical que andava apagado havia mais de uma década: o “Rock Brasília”. Até mesmo o mais cético dos espectadores teve uma pitada de emoção ao assistir ao desfile de gerações roqueiras da capital federal no palco montado na Esplanada dos Ministérios no último final de semana: dos oitentistas Plebe Rude, Escola de Escândalo, Fallen Angel e Detrito Federal até os atuais Watson, The Pro, Superquadra e Móveis Coloniais de Acaju, passando ainda pelos representantes noventistas do Little Quail, Maskavo Roots e Os Cabeloduro – neste pacote, teve espaço até para os cariocas do Paralamas do Sucesso, espécies de padrinhos do rock federal. O clímax do festival foi a homenagem à Legião Urbana, maior nome da história do rock local (e, talvez, nacional), que reuniu membros de bandas brasileiras de diversas gerações.

Mais do que uma celebração, a 12ª edição do Porão do Rock acabou trazendo um sopro de motivação para algo que andava bem em baixa: a atual cena roqueira brasiliense. Quem acompanha as apresentações de bandas locais nos últimos dez anos, sabe que, com exceção do Móveis Coloniais de Acaju, o que mais se vê são shows meio vazios, com uma platéia formada quase que somente pelos amigos dos integrantes das bandas. Realmente, nada mais contrastante como os anos de ouro do rock da capital federal, que já viu seus representantes lotando estádios Brasil afora. Neste ponto, o Porão do Rock teve o papel de recordar-nos que vivemos numa capital com vocação não só para o rock, mas para a música POP, de uma forma geral.

Cheguei a Brasília em 1989, época em que existia uma verdadeira idolatria em relação às bandas da Capital. Lembro de, em minhas primeiras idas ao shopping Conjunto Nacional com a minha mãe, ver vários estandes com camisas que estampavam o nome de bandas brasilienses à venda. Além disso, era comum ter amigos de escola ou de quadra que tinham bandas, numa proporção bem maior do que em outros estados onde havia morado. O rock era uma espécie de orgulho e hábito locais, principalmente para uma cidade nova como Brasília, que ainda buscava a sua identidade cultural.

Viver minha adolescência aqui me fez adquirir uma “alma brasiliense”. E, de uma hora para outra, me vi fazendo parte dessa turma que produzia rock na capital federal. Para a minha geração, dos anos 90, essa história de ser uma banda brasiliense ainda tinha algum valor e rendia até espaço em jornais de outros estados. De certa forma, o estouro nacional da geração anterior (Plebe, Capital e Legião) fazia brotar uma curiosidade por parte tanto do público e crítica brasilienses quanto de outros estados pelo que estava sendo produzido por aqui.

O engraçado é que as bandas que “deram certo” nos anos 90 acabaram sendo aquelas que conseguiram se desapegar desse rótulo de Rock Brasília, o tal gênero politizado dos anos 80. Lembro que, no momento de entressafra entre os anos 80 e 90, as bandas que comandavam os shows e pequenos festivais locais eram os clones de Legião & Cia. E, subitamente, aquelas bandas de moleques que tocavam, sem muita pretensão, forró-core, hardcore, rockabilly, reggae, ska e indie rock começaram a ser vistas como as originais e se destacar dentro e fora da cidade. A mesma coisa aconteceu na passagem dos 90’s para os anos 00’s: o que predominava eram os filhotes de Raimundos, até que alguns grupos quebraram o paradigma do rock irreverente e de putaria, para impor uma nova marca “mais séria”.

O interessante é que, mesmo ficando cada vez mais para trás, o Rock Brasília dos anos 80 continuou sendo um fantasma (meio conservador, em alguns aspectos) para as gerações posteriores. Isso porque ele se tornou a base de comparação para qualquer banda nova que comece a se destacar na capital federal. Ora, não é preciso ser nenhum gênio para notar que um novo Renato Russo não vai aparecer por aqui nem tão cedo - ou nunca mais. Além disso, sem tirar o mérito dos talentosos artistas dos anos 80, o período pós-ditadura e o Plano Cruzado criaram um clima absurdamente favorável para o estouro de bandas de rock politizadas. Isso nos leva a crer que, simplesmente, é muito difícil que condições tão positivas façam o rock brasiliense voltar a ser uma ‘grife’ e ter o mesmo reconhecimento do passado. E, na verdade, talvez esse parâmetro de estouro nacional nem seja mais muito importante em tempos de internet e “independência”.

E é nesse ponto onde quero chegar. No último Porão do Rock, encontrei muita gente que não via há tempos, que foi ao festival para reviver momentos felizes de suas vidas. Nada contra esse saudosismo: eu mesmo faço isso de vez em quando e acho até saudável, se não for excessivo. E quem sou eu para falar de saudosismo num festival que eu mesmo toquei com uma banda já extinta? Por outro lado, chega a ser paradoxal notar que, em um evento que se propõe a elevar a bola do rock brasiliense, as bandas novas da cidade (com exceção sempre do Móveis) estivessem numa posição de tão pouco destaque, confinadas ao Palco Pílulas e concorrendo com as apresentações das grandes atrações. De certa maneira, talvez o rock de Brasília volte a brilhar dentro e fora da cidade quando parar de viver de sua história e passar a olhar para frente, a fazer história.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Reaprendendo a tocar as próprias músicas


Nos últimos dias, tenho me dedicado a uma tarefa inusitada: reaprender a tocar as músicas que eu mesmo ajudei a compor. Tudo porque a formação original do Maskavo Roots, banda que integrei até 1996, foi convidada para tocar na 12ª edição do festival Porão do Rock, que acontecerá no próximo final de semana na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.

Já faz 13 anos que não tocamos juntos, tempo suficiente para que esquecêssemos boa parte dos arranjos – e das frases de guitarra, no meu caso. Além das recordações dos momentos que passamos juntos, o interessante desse reencontro com o passado é ver como funcionava nosso comportamento e pensamento musical quase uma década e meia atrás. Como num filme da série De Volta para o Futuro, sinto-me como um velho Marty McFly observando à espreita a sua versão mais jovem e torcendo para que o garoto não cometa erros que possam desviá-lo de um bom destino. Mas como a irresponsabilidade e a falta de noção são marcas quase inerentes da juventude, o que nos resta é relevar os tropeços cometidos ao longo do caminho.

Gravamos o nosso primeiro disco muito jovens, numa faixa que ia dos 19 aos 22 anos. O ano era 1994 e nós tínhamos assinado contrato — numa filial do McDonalds em Ipanema, RJ — com o Banguela Records, selo recém-lançado pelos Titãs. Em pouco mais de um ano e meio, nossa vida sofreu uma reviravolta: saímos da posição de uma banda quase colegial, que fazia shows em festas no Park Way e em casas noturnas e bares da cidade, para começar a tocar em outros estados e conhecer pessoas que só víamos antes na televisão. Uma das nossas qualidades era não sermos blasés, e, por isso, achávamos graça e ríamos entre nós quando conhecíamos um membro dos Titãs ou de outra banda famosa.

Como não tínhamos muita noção de como funcionava a vida de um músico profissional, estipulamo-nos a ingrata tarefa de ensaiar todas as tardes da semana – e foi isso o que fizemos por quase dois anos, na chácara do saudoso Marcão Adrenalina (tio do nosso baixista Marrara), perto do Posto Colorado. Ao chegarmos para a gravação do disco em outubro de 1994 no estúdio Be Bop, em São Paulo, recebemos até elogios dos produtores Carlos Eduardo Miranda e Nando Reis pelo esmero com a execução e arranjo das músicas. Do nosso lado, achávamos que havíamos feito apenas a nossa parte, apesar de hoje saber que aquele esquema anormal de ensaios diários nos fez dar um salto musicalmente.

E, neste ponto, acho que uma das nossas maiores qualidades era sermos criteriosos: cada componente sabia muito bem as partes que o outro tocava, pois checávamos e rechecávamos se o que um fazia chocava com a parte do outro. Era uma atividade que chegava a ser maçante, num esquema meio “treinamento de trapezistas de circo chinês”, mas que, no final, rendia bons resultados. A outra face dessa moeda chamada perfeccionismo era a dureza em relação aos nossos erros, o que, junto com a própria divergência dos caminhos musicais a tomar, tornou parte da nossa convivência insuportável. Além disso, engessamos muitas boas idéias que poderiam ter decolado se não fosse pela nossa própria caretice e excesso de zelo pelo que era “correto”.

Um dos efeitos positivos da passagem de tempo é nos fazer recordar cada vez mais dos bons momentos, deixando os ruins para trás. Dentre as minhas ótimas recordações, está um show com o Chico Science & Nação Zumbi em 1994, num campeonato de surfe em Porto de Galinhas: além do astral praiano e da nossa boa apresentação, foi lá onde conheci vários amigos da cena roqueira pernambucana. Outro esquema interessante foi a abertura de um show do Jorge Benjor no Ginásio do Ibirapuera, no que seria o primeiro link ao vivo da MTV Brasil: naquela tarde, durante a passagem de som, vi um tímido Fred 04 se apresentando e entregando o primeiro disco do mundo livre S/A para o seu grande ídolo Jorge Ben(Jor). Até o estressante dia em que fomos literalmente apedrejados na abertura de um show gratuito dos Titãs, no Vale do Anhangabaú, em São Paulo, soa engraçado visto agora de longe.

A despeito das experiências em outros estados, o mais legal é lembrar do que vivemos em Brasília naquela época: shows no Bronx, na Zoona Z, no Barcanal, na Concha Acústica da UnB, na Sala Martins Pena do Teatro Nacional e em tantos outros locais, ao lado de bandas amigas como OZ, Raimundos, Little Quail, Spigazul, Sunburst, Animais dos Espelhos, Low Dream, Firewood, Câmbio Negro, Depois das Três, El Kabong, Dungeon, Succulent Fly, Os Cachorros das Cachorras, DFC, Restless, Os Cabeloduro, Os Wallaces, entre outras. Trazendo para um plano ainda mais “íntimo”, chegam a ser emocionantes as memórias dos momentos em que nós sete, componentes da banda, passamos juntos: as brincadeiras e piadas nos ensaios, as soluções e idéias para a composição das músicas, as guerras de cuspe e fumaça anti-incêndio nas imprudentes viagens de carro interestaduais (uma delas sem o porte do documento do veículo!!!).

Quando lembro da minha versão aos 20 anos, costumo me achar um completo idiota: um sujeito meio inseguro, falastrão, agressivo, dono da verdade. O contato com as músicas antigas do Maskavo prova que, a despeito de algumas características negativas, talvez exista um preconceito de mim para comigo mesmo quando jovem. Sim, pois se aquelas músicas revelam uma forma de pensar muitas vezes ingênua, por outro lado, também mostram uma certa pureza de pensamento, um desprendimento e uma abertura em relação à vida e à música. Se hoje eu tenho que “penar” para tocar algumas frases simples de guitarra, talvez essa analogia do “correr atrás do que é puro” também sirva para outras áreas da vida.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

A admirável arte de fazer tudo igual


Uma das características mais admiráveis na Música – e nas Artes, em geral – é a versatilidade. Além de revelar as ferramentas dominadas pelo artista, ela denota-lhe um certo refinamento intelectual, uma espécie de prova de que sua obra é fruto do acesso e amadurecimento de diversas referências.

No rock, como não poderia deixar de ser, a diversidade também é muito celebrada. Basta olhar para a banda mais famosa da história, The Beatles, que teve recentemente suas canções lançadas no videogame Rock Band: com uma destreza e bom gosto fenomenais, os Fab Four iam do rock’n’roll mais clássico (Back in the USSR) ao country (I’ve Just Seen a Face), do experimentalismo (Revolution 9) ao primórdios do heavy metal (Helter Skelter), da balada romântica (Michelle) ao blues rasgado (Why Don’t We Do It In the Road). Ouvir, portanto, um disco dos Beatles é como caminhar por diversos ambientes, cada um com peculiares paisagens - e, certamente, os jogadores de Rock Band terão que ralar para dominar cada um desses recantos.

No entanto, o mesmo rock que abriga a valorização da versatilidade, estranhamente também abre espaço para o enaltecimento do seu extremo oposto: a repetição. E, neste nicho, surgem alguns dos mais interessantes músicos do gênero, que, simplesmente, viraram as costas para a diversidade de referências e resolveram optar por um único e retilíneo caminho, sem desvios ou encruzilhadas.

Talvez o primeiro artista de “rock igual” da história seja o inigualável Chuck Berry. Quem nunca ouviu o riff inicial de alguma música de Chuck Berry e achou erroneamente que era Johnny B. Goode que atire a primeira pedra. Eu confesso que, na primeira vez que assisti ao documentário Chuck Berry, o Mito do Rock (Hail! Hail! Rock’n’Roll, em inglês), em 1990, achava que todas as músicas desaguariam em Johnny B. Goode. Mas, para minha surpresa, os refrões eram (levemente) diferentes. Demorei para sacar a genialidade de Chuck Berry no meio daquele mar de riffs “johnnybgoodianos”.

Outros gênios na arte de fazer tudo igual são os punks novaiorquinos do Ramones. Lembro até hoje de quando comprei o disco Rocket to Rússia (1977) no formato cassete: estava gostando muito das músicas e, em especial, da última do lado A, We’re a Happy Family. Quando mudei a fita de lado, fiquei bastante surpreso ao sacar que a primeira música do Lado B, Teenage Lobotomy, tinha o riff quase igual. Depois, fui notar que os Ramones eram simplesmente mestres em se auto-plagiar. O mais intrigante nessa história é que a tal repetição não ameaçava nem um pouco o moral que a banda tinha entre seus fãs – talvez até o reforçasse.

Ainda na seara do punk rock/hardcore, vale também ressaltar outro grupo bem interessante: os finlandeses do Rattus. Lembro até hoje da sensação de ouvir um disco do Rattus pela primeira vez, no final dos anos 80: a música de abertura tinha um refrão com a sonoridade parecida com a palavra “muslabu”. A segunda música, por sua vez, era muito parecida com a primeira, mas o refrão caía em algo como “muslabu vã”. Ou seja, quase tudo igual, com exceção do fonema “vã” — que, em finlandês, deve significar algo como “E vou matar sua mãe” ou “E lhe esfaquearei pelas costas”.

Caminhando rumo ao hard rock, nos deparamos com os australianos do AC/DC, uma das bandas mais de macho da história. Eu sempre pensei em como deve ter sido difícil o primeiro dia de emprego do atual baterista do AC/DC. O Angus Young, guitarrista e um dos líderes da banda, deve ter chegado para o “batera” e falado: — A batida é assim ó, “pá-pum-pá-pum-pá-pum”. E o baterista deve ter perguntado: — De que música? E, no meu diálogo imaginário, Angus respondeu: — Como assim “de que música”? É de TODAS as músicas, meu irmão.

Piadas à parte, o mais legal desses artistas talvez seja a despretensão de estar sempre inventando a roda. Se, por um lado, a maioria deles perde no quesito versatilidade, acaba ganhando muitas vezes em coerência. Tenho um colega que afirma não gostar de ter surpresas ao ouvir uma música. Na visão dele, o prazeroso é saber onde os acordes de uma canção vão parar, sem muitos solavancos no percurso. É uma visão no mínimo curiosa, mas que demonstra muito do prazer de se ouvir, sem pretensões, um bom e velho rock’n’roll. Além disso, em tempos de Rock Band, fica muito mais fácil decorar as partes das músicas e tirar onda com os amigos.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Meu problema com as bandas novas














Não conheço o Friendly Fires. Nunca ouvi o Fleet Foxes. Não acompanhei a “ascensão e queda” do Klaxons e da New Rave. Nunca me empolguei com o Arctic Monkeys. Não dei a mínima para a separação do Libertines e para os problemas com a polícia do seu ex-integrante Pete Doherty. Ainda chamo o Franz Ferdinand e o Arcade Fire de grupos revelação. Sim, eu devo admitir: tenho um problema com as bandas novas.

Eu não sei de onde vem exatamente esse meu desinteresse. Já mexi e remexi na minha consciência e não consigo encontrar uma resposta convincente para tal fato. Durante um tempo, cheguei a sustentar o discurso que essa nova geração era “muita pose e pouca música” e que o produto musical gerado por ela era apenas uma reedição fria do som feito em outras décadas (talvez pelo excesso de informação) — o que não chega a ser uma grande mentira. No entanto, de alguma forma, sei que outras bandas com as quais já me empolguei também se preocupavam com o estilo e punham os pés no passado: o que é o Soundgarden senão – de maneira grosseira — uma competente e estilosa mistura de Black Sabbath, Deep Purple e Led Zeppelin?

Uma outra explicação para a minha falta de ânimo com as bandas novas talvez venha do simples fato de eu não ser mais um garoto. Para sustentar essa teoria, já recorri àquele papo de que a música pop se recicla a cada 20 anos. Então, como os anos 80 foram a primeira década que acompanhei e os anos 90, a segunda, é natural ter me empolgado com as duas, por mais que elas tirassem do baú, respectivamente, as décadas de 60 e 70. Mas, com a virada do milênio, passei a não achar tão legal o fato de o Interpol e o She Wants Revenge se parecerem tanto com Joy Division ou mesmo o Franz Ferdinand ser uma espécie de Gang of Four dos tempos modernos. Afinal, eu vi boa parte desse filme antes.

Ok, já achei dois bons argumentos para não me empolgar com as bandas novas, mas isso não é o suficiente. Até porque conheço várias pessoas mais velhas do que eu que ainda gostam de estar antenadas com as novas tendências. Então, a pergunta permanece: — Por que as bandas novas não conseguem mexer comigo?

Já passei uma situação engraçada por causa dessa minha falta de interesse. Há cerca de um ano, reencontrei no Orkut um jornalista musical com o qual não falava havia alguns anos. Conversa vai, conversa vem, ele me perguntou o que eu andava ouvindo. Eu respondi que, das bandas novas, gostava de The Strokes, White Stripes, Queens of the Stone Age e Foo Fighters. Somente depois de apertar o botão de envio da mensagem é que notei que a banda mais nova citada por mim tinha quase dez anos!!! Naquele momento, acabara de revelar o quanto eu estava “out” e aquele equívoco aniquilaria qualquer chance de receber uma resposta de alguém tão antenado — o que de fato aconteceu!

O meu grande medo é que esse desânimo vá aumentando até o ponto de eu parar completamente de ouvir qualquer artista novo. Então, virarei um roqueiro igual a aqueles velhos cabeludos que vestem colete de couro dos Hells Angels, andam de moto estilo Harley Davidson e freqüentam shows do Creedence Clearwater Revisited. Tudo bem, acho que nunca terei uma Harley Davidson nem um colete de couro preto, mas, sei lá, posso virar uma espécie de roqueiro tradicionalista com camisa de flanela, que vai ao show do Frank Black na esperança de ouvir músicas dos Pixies.

Mas ainda tem uma possibilidade de destino pior. É o caso de uns amigos que começaram a curtir hardcore comigo e que, à medida que se tornaram punks radicais, foram ouvindo sons mais rápidos e pesados. Recordo-me que gostávamos de Exploited, GBH e Napalm Death e eles começaram a achar isso “som de playboy”, passando a ouvir somente a podreira do Carcass. Depois de considerarem Carcass leve demais, partiram para uma jornada sem volta rumo à banda Sore Throat — cujo disco de vinil tinha 101 músicas! Numa penúltima etapa, só ouviam o que chamavam de anti-música. A história terminou com meus ex-companheiros deixando seus discos de lado e passando a criar peixes ornamentais (!), pois qualquer emissão sonora ritmada e com um mínimo de melodia era considerada uma ameaça à dignidade deles.

Não me considero um extremista e acho difícil que o meu destino seja me dedicar a Bettas, Guppies e Espadas-sangue. Outro dia, por exemplo, fui a uma festa de rock “descolada” e até curti vários desses novos sons. Ainda não sei o nome da maioria das bandas, mas conheço o DJ e tentarei pegar informações sobre o setlist dele. Espero que tal ação me desperte interesse pela geração atual — até porque não dá para ficar ouvindo Led Zeppelin, The Clash e Bob Marley a vida toda.

Um aspecto positivo desse distanciamento, pelo menos, é não perder o meu tempo (e ânimo) com qualquer novidade e celebridade instantânea que surja a cada edição da revista inglesa NME - ou, no Brasil, a cada postagem do Lúcio Ribeiro. Nesse ponto, confesso que tenho até um certo orgulho de nunca ter caído na “armadilha” de um The Killers ou um Bonde do Rolê, o que me faz crer que a maturidade e o mal humor têm até suas vantagens. Pensando bem, eu não descartaria a hipótese de começar a pesquisar o preço dos aquários...