terça-feira, 28 de julho de 2009

O curioso caso de Janis Joplin


Alguém aqui gosta de Janis Joplin? Eu não. Acredito que a quase totalidade dos leitores desse blog também se alinhe com a minha posição. Na verdade, conheci pouquíssimas pessoas que fossem fãs da ídola hippie, a tal “cantora branca de voz negra”. E o comentário geral que ouço é que todos acham o som “xarope” demais, chato mesmo, talvez só tragável para estudantes do quinto semestre de antropologia de universidades federais.

Para piorar a situação, as únicas vezes em que escuto Janis Joplin são por meio de cantoras iniciantes, insuportáveis e sem sal, que insistem em entoar versões à capela de Mercedez Benz, meio que para tirar onda. Mas isso é um nicho muito específico, somente comparável ao de guitarristas que testam seus instrumentos na loja tocando Stairway to Heaven, do Led Zeppelin, ou o arpejo de Paganini imortalizado por Steve Vai no filme Crossroads.

Vez ou outra, também leio sobre Janis Joplin em revistas de música e comportamento, lembrando de como ela era doidona, coisa e tal. Mas são sempre histórias meio deploráveis, que vão desde o dia em que um fotógrafo brasileiro recusou uma “transa” com a ídola hippie, por ela estar com bolachas Maria coladas nas costas nuas e suadas, até o dia em que foi sacaneada em sua cidade natal — Port Arthur, no Texas — mesmo depois de se tornar famosa. Ah, tem também as peripécias de Janis Joplin no Rio de Janeiro com o namorado brasileiro Serguei, mas essas histórias ninguém sabe exatamente se são realidade ou imaginação causada pelo alto consumo de substâncias lisérgicas.

Enfim, o que quero dizer é que Janis Joplin está, ao mesmo tempo, em todo lugar e em lugar nenhum. Ou seja, todos a conhecem, mas ninguém a ouve, o que gera uma espécie de contradição. Numa analogia pífia, é como a febre dos produtos da Amway nos anos 90: se ninguém os comprava, como os vendedores da base da pirâmide poderiam ficar ricos?

A minha impressão é que, um dia, os organizadores do Rock’n`Roll Hall of Fame vão, simplesmente, decidir retirar o nome de Janis Joplin de lá. A ação inédita virá pela óbvia constatação de que ninguém mais conhece música alguma da "cantora branca de voz negra" - exceto Mercedez Benz, talvez.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

A unanimidade (in)contestável da Nação Zumbi


A Nação Zumbi vai tocar na minha cidade neste sábado (25). Não precisei ler matéria em jornal ou mesmo ver outdoors para ter acesso a essa informação. Ela foi chegando de boca em boca, por amigos de diversos segmentos sociais que vinham me perguntar se eu iria à apresentação dos mangueboys. Meus “chegados” certamente vão. Eu ainda não sei.

A minha dúvida não vem do fato de eu desgostar da banda. Pelo contrário: sou fã. O lance é que dei uma enjoada do show deles, pois assisti a muitos nos últimos anos. Além disso, devo confessar que tenho ficado incomodado com uma certa unanimidade que gira em torno da Nação Zumbi, tanto por parte dos fãs quanto da imprensa, que insistem em colocá-los como “a melhor banda do Brasil”, uma espécie de gênios incontestáveis da raça. E o pior é que, talvez, os próprios membros da banda estejam se convencendo disso...

O que me fez notar essa unanimidade — burra, como diria Nelson Rodrigues — foi assistir a alguns shows da NZ em festivais. Lembro de a apresentação deles ser apontada como a melhor do evento antes mesmo de entrarem no palco. As pessoas sempre chegavam dizendo: — Foi demais, não foi? E a verdade é que, algumas vezes, a performance não tinha sido tão legal assim.

Um dos “pontos fracos” que enxergo atualmente na Nação é fato de o ritmo ter ficado devagar demais. Essa sensação fica nítida quando eles tocam músicas dos seus dois primeiros discos ainda gravados com Chico Science: Da Lama ao Caos e Afrociberdelia. Tudo bem, algum fã mais entusiasmado pode me contestar: mas isso é uma opção estética, uma aproximação proposital com o Dub, espécie de reggae doidão e cheio de efeitos. Hum ... eu até gostaria de crer nisso, mas, infelizmente, acho que essa “ralentada” vem também das limitações vocalísticas e performáticas de Jorge du Peixe.

Essa impressão de “mudanças por conta de limitação” ficou ainda mais clara para mim quando assisti a um show do Los Sebozos Postizos, projeto paralelo dos membros da Nação dedicado a versões para clássicos de Jorge Ben, Tim Maia, Beatles, entre outros. Novamente, todas as releituras tendiam de uma forma não muito natural para o lado “down” da coisa. Bem, alguém pode me dizer de novo que é a tal opção estética pelo ‘reggae doidão’. Não quero subestimar essa hipótese, até porque estou falando de uma banda que, já no primeiro disco, trazia uma música intitulada “Coco Dub”. Mas, como disse, acho que a limitação de Du Peixe, que “teve de optar” por usar um efeito delay na voz, auxiliou na busca por esse formato.

Da parte da mídia, também sinto uma certa vibração desmedida pelo Nação Zumbi. Lembro, por exemplo, que os projetos paralelos Maquinado (do guitarrista Lúcio Maia) e Três na Massa (do baixista Dengue e do baterista Pupilo) receberam ampla divulgação e fartos elogios da imprensa especializada. Ora, realmente os caras merecem esse destaque, até por sua importante contribuição ao rock brasileiro e, de forma geral, à MPB. Mas me recordo, por exemplo, de estar assistindo a um clipe do Três na Massa e, ao receber a visita de um amigo desavisado, ouvi dele: essa música não é muito legal, com um vocal que parece desafinado. E aí me caiu a ficha: até eu estava entrando na farsa da genialidade dos membros da Nação.

A minha intenção com essas críticas não é denegrir ou diminuir a importância da Nação Zumbi. Na realidade, o meu ponto é mais questionar essa unanimidade e excesso de reverência que giram em torno da banda, o que não considero muito saudável. Quando falei que até os próprios membros talvez estejam se convencendo dessa genialidade, estava me referindo ao fato de, na semana passada, assistir ao guitarrista Lúcio Maia indicar um clipe da NZ na edição especial de clássicos do programa Toca Aí, da MTV, em comemoração ao Dia Mundial do Rock. Considerei a escolha de um clipe da própria banda, num programa que exibia clássicos, meio esquisita e imodesta.

De qualquer forma, vale lembrar que assistir à Nação Zumbi é sempre uma aula de música. A alta qualidade que atingiram nestes 15 anos de estrada, desde o lançamento de seu primeiro disco, Da Lama ao Caos (1994), é de impressionar até mesmo o ex-guitarrista do Pink Floyd, David Gilmour, que elogiou os mangueboys durante a participação do grupo no programa do inglês Jools Holland.

Outro ponto louvável na carreira da banda é a forma como superaram a morte de seu líder, Chico Science. Conceitualista nato, Science também era um carismático frontman e porta-voz do grupo. A solução de colocar o grande brother de Chico e também conceitualista Jorge du Peixe nos vocais e letras foi mais do que acertada. E, se a banda passou um por período em que ainda buscava sua nova marca (nos discos CSNZ e Radio S.amb.A), desde 2002 vem lançando álbuns cada vez melhores (Nação Zumbi, Futura e Fome de Tudo).

Hoje tenho vários amigos respeitáveis que até preferem a atual Nação Zumbi àquela capitaneada por Chico Science. E, sob certo ponto de vista, a banda realmente amadureceu, principalmente na parte instrumental. Mesmo com toda essa moral e competência, acho que eles ainda estão longe de se tornarem incontestáveis, como quer boa parte de seus fãs e da imprensa.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Boas ações de uma rádio “maldita”


A idéia desse texto surgiu a partir da comemoração do Dia Mundial do Rock, no último dia 13 de julho. Apesar de não dar muita bola para a data, resolvi usar o pretexto para homenagear esse estilo musical, que vem atravessando gerações como, talvez, a principal manifestação musical dos jovens. Neste ponto, vale informar que, quando digo rock, refiro-me a todas as suas variações ao longo desses cinqüenta e poucos anos de existência: do grindcore ao pop, do psicodelismo ao funk metal, do hard rock ao... emo (!) — bom, acho bom pararmos por aqui.

Nesta minha procura por algo que representasse o rock’n’roll, pensei em vários ícones: Chuck Berry, Elvis, Beatles, Led Zeppelin, The Clash, Nirvana. Achei que seria injusto escolher somente um deles e resolvi optar por algo que englobasse o estilo como um todo. Foi aí que me veio a idéia de homenagear uma rádio: a niteroiense Fluminense FM, conhecida como “Maldita”, emissora essencial na divulgação de bandas brasileiras dos anos 80 (como Paralamas, Legião e Kid Abelha, entre outras) e importantíssima na minha educação musical.

Conheci a Fluminense FM em 1988, quando me mudei para o Rio de Janeiro. Estava vindo de Recife, com 13 para 14 anos, e já gostava de música, mas meio que num segundo plano. O meu lance até então era o esporte. A mudança para o Rio me fez perder o ciclo de amigos que já havia construído na capital pernambucana, entrar no colégio mais chato que já estudei na vida e enfrentar o crowd não muito amistoso dos surfistas cariocas. Enfim, desânimo total, o que me fez permanecer em casa por mais tempo do que eu desejava. O lado bom era ter a companhia da Fluminense FM.

E, realmente, foi um impacto me deparar com a programação da “Maldita”. Em Recife, quase não existiam programas de rock alternativo na rádio: que eu me lembre, só havia o de um cara chamado Carlinhos, que passava aos sábados. Na Fluminense, a programação era toda alternativa, sete dias por semana, 24 horas por dia. E, neste ponto, vale lembrar que estávamos nos anos 80: ou seja, se você não tivesse com o disco em suas mãos, simplesmente não conseguia ouvir a música que tanto queria. Além disso, o mercado brasileiro não comportava o lançamento de álbuns mais alternativos, de bandas como Violent Femmes ou Dream Syndicate, por exemplo. O negócio era realmente bem difícil.

A Fluminense FM surgia, então, como um oásis no meio desse deserto fonográfico. Você podia ligar o rádio a qualquer hora e se deparar com uma música dos conhecidos Siouxsie and the Banshees, Echo and the Bunnymen, Jesus and Mary Chain e The Cure ou até de bandas mais obscuras, como That Petrol Emotion, Fields of Nephilim, Lords of the New Church (do ex-Dead Boy Stiv Bators), Toy Dolls ou dos brasileiros Violeta de Outono, Replicantes e De Falla. Ainda tinha espaço para apostas como The Woodentops, Screaming Blue Messiahs, Sugar Cubes, Mighty Lemon Drops e Godfathers, por exemplo. Os clássicos, como The Who, Jimi Hendrix e Led Zeppelin, também não eram esquecidos. Ou seja, era uma programação bem balanceada, que unia artistas consagrados e recentes, estrangeiros e brasileiros.

Os programas eram atrações à parte: bem pensados e prontos para caber em uma fita cassete. Lembro até hoje de vários deles (alguns nomes eu esqueci):

10h às 11h - McTwist – O nome derivado de uma manobra de skate já dava a pista: o som era focado nas preferências dos skatistas, o que, na época, significava basicamente hardcore e hip hop. Entre as bandas que costumavam tocar, estavam: Agent Orange, Suicidal Tendencies, Minor Threat, Beastie Boys, Run DMC, Oingo Boingo e Hüsker Dü. Como batia com o meu horário de aula, eu só ouvia nas férias ou quando faltava ao colégio.

13h às 13h30 – Esqueci o nome desse programa. A idéia era simples, mas prática: meia hora tocando músicas de uma banda, sem intervalo. Ou seja, bastava comprar uma fita K-7 de 60 minutos e colocar para gravar. Gravei várias fitas assim: The Clash, The Church, Dead Kennedys, Lloyd Cole and the Commotions, os californianos do “X”, etc. Cheguei a gravar um especial do T-Rex, mas não entendi muito o som da banda à época e taquei algo por cima.

20h às 21h – Também esqueci o nome desse programa. A idéia aqui era abrir espaço para a programação feita pelos ouvintes. Obviamente, a qualidade dependia do gosto da pessoa que mandava a programação. Mas já ouvi muita coisa legal. Lembro que de ter ouvido pela primeira vez “Dança do Semáforo”, da Plebe Rude, e “Popularidade”, do Escola de Escândalo, em um desses programas.

22h às 24h (quartas-feiras) Novas Tendências – Apresentado pelo DJ José Roberto Mahr, trazia as novidades do mundo da música – uma espécie de Lúcio Ribeiro das ondas do rádio. Como passava num horário meio tardio para um colegial como eu, muitas vezes tinha que deixar a fita gravando. Foi lá que conheci Pixies, Wedding Present e Soup Dragons, por exemplo. Lembro de uma outra banda californiana chamada Tragic Mulatto, que nunca vingou.

No começo de 1989, vim morar em Brasília. Nas minhas visitas ao Rio, no período de férias, sempre reservei um espaço para ouvir a Fluminense FM. Ao longo dos anos, notei que, apesar do aparecimento de outros bons programas, como o College Radio (apresentado por Rodrigo Lariú) e Hellradio (apresentado por André X e Tom Leão), a rádio foi caminhando para um lado mais comercial, meio pop-surfístico demais.

Simbolicamente, no ano de 1994, o Maskavo Roots, banda a qual eu integrava, foi chamada para tocar num festival promovido pela Fluminense FM. O evento ocorreu na praia de Ipanema e contou com a participação de Ira, Plebe Rude, Little Quail, Pelvs, O Rappa, Fausto Fawcett, entre outros. Algum tempo mais tarde, a rádio fecharia suas portas - tentando retornar vez ou outra, mas sem muito sucesso.

Passados 20 anos daquele meu contato intenso com a “Maldita”, ainda me impressiono com o refinamento e conhecimento de causa presentes em sua programação, indo desde as músicas até as vinhetas. É aquele tipo de experiência que, por acontecer tão cedo na sua vida, você não dá muita bola, acha que vai encontrar mais daquilo muitas vezes.

Mas não foi exatamente o que aconteceu: os anos foram passando e, infelizmente, não me deparei com programações de tamanha qualidade. Talvez a resposta esteja até numa questão simples: a Fluminense FM, provavelmente, não tinha tanto compromisso com o lucro – “mal” que faz com que a MTV, por exemplo, seja obrigada a - ou tenha a justificativa de - exibir programas insuportáveis de adolescentes/auditório.

Hoje, os podcasts e os canais cada vez mais segmentados cumprem o papel de luz no fim do túnel para os amantes da boa música. Espero que esses adolescentes que começam a gostar de rock e sacam bastante de tecnologia consigam boas fontes que lhes sirvam como oráculo. A Fluminense, no caso, foi o meu oráculo, a minha Escola do Rock.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Clash Futebol Rockers no Arena City Clube


Neste sábado (18), o Clash City Rockers — banda tributo a Joe Strummer & Cia. da qual faço parte — vai se apresentar na edição especial de três anos da festa London Calling, que acontece no Arena Futebol Clube, a partir das 22h30.

Quem quiser “dar um chego lá na festeenha”, tá convidado. Fora o CCR, vai rolar Oasis Cover e mais um monte de DJs.

Os ingressos antecipados custam R$ 10. Na porta do evento, o preço sobe para R$ 15 (até 1h30) e R$ 20 (a partir de 1h31).

O Clash City Rockers surgiu nos anos 80, como um projeto paralelo de membros da Plebe Rude. Desde 2003, é formado por: Philippe Seabra (vocal e guitarra), Rafael Farret (teclado e backing vocal), Pedro Ivo (baixo e backing vocal), Txotxa (bateria) e eu (guitarra).

Como Philippe Seabra faz questão de frisar, trata-se de uma banda T-R-I-B-U-T-O e, não cover — embora ninguém, fora ele mesmo, saiba exatamente a diferença entre uma e outra.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Dia do Homem, Rock de Macho - um post descaradamente sexista


Uma colega de trabalho leu no jornal e veio me avisar, em tom de brincadeira, que hoje é o Dia do Homem. Não sei nem quero saber por que a data foi criada, pois já sinto um certo cheiro de forçação de barra no ar. De qualquer forma, o mote veio a calhar para um tema sobre o qual eu estava, coincidentemente, pensando ontem: o rock de macho.

A idéia veio depois de um dia de cão, em que encontrei conforto num rock pesado qualquer. Notei que a agressividade da música batia com a minha e a soma disso acabou tendo um efeito tranqüilizador sobre o meu humor. “Raiva é uma Energia”, já dizia John Lydon na música Rise, do PIL. Engraçado é que o Green Day parodiou o verso para “Violência é uma Energia” no seu mais recente single, “Know Your Enemy”. De certa forma, os homens precisam de alguma dose de agressividade no seu dia-a-dia para a construção da sua própria calma. É por isso que inventaram o boxe, o futebol, a corrida de automóveis e, em última instância, o porradobol, símbolo máximo dos jogos (ou lutas) masculinos.

Agressividade tem tudo a ver com rock de macho, embora não seja a única variável que conta. Às vezes, um blues calmo do Almann Brothers ou do ZZ Top pode carregar muito mais macheza do que uma música barulhenta do Prodigy. Rock macho é, sei lá, um tipo de postura. A macheza está no ar, de forma sutil (palavra não muito presente no vocabulário masculino), e nem sempre é fácil de ser explicada e, principalmente, captada pelas mulheres. Mas o fato é que todo mundo sabe que, se rolar uma porrada entre a galera do ZZ Top e do Belle and Sebastian, quem ganha não são os "fofos" escoceses.

E quem seriam os maiores ícones do rock macho? De cabeça, eu lembro de AC/DC, Van Halen, Black Sabbath, Lynyrd Skynyrd e o maior de todos, ZZ Top. No Brasil, Camisa de Vênus é imbatível, seguido pelos pupilos do Matanza.

Deixa eu dar um exemplo como funciona esse lance de rock de macho. Há alguns anos, eu estava vendo um show do AC/DC na TV e, em determinado momento, o palco se abria para a entrada de alguns...CANHÕES. Sim, CANHÕES. Neste instante, as câmeras flagraram o delírio do público e ficou claro que 99% ali eram homens. As poucas mulheres presentes estavam nos ombros de seus namorados ou, se estavam sozinhas, tiveram que fingir achar legal a presença do material bélico no palco. Mas o fato é que a entrada de canhões era, claramente, uma mensagem quase criptografada de homem para homem.

O mesmo princípio de sociedade secreta masculina pode ser utilizado nos clipes de carros e mulheres de biquíni do ZZ Top, muito apreciado somente por homens, ou no grito animado e a plenos pulmões de “Piraaaaaaaanha”, por garotos nas pistas de dança, para completar o “Oh, Sílvia”, cantado pelo Camisa de Vênus. Ou seja, isso é macheza em seu estado mais puro: um mundo impenetrável para as mulheres. Aliás, já vi muita mulher dizendo que achava o Marcelo Nova nojento. E a resposta talvez seja: ele fala um outro idioma, incompreensível para as moças.

A propósito, ultimamente anda na moda as garotas dizerem que gostavam de brincar com os homens na infância, pois achavam a brincadeira com bonecas tediosa. Tenho a impressão que a maioria dessas mulheres modernas ficou decepcionada na adolescência, quando, ao primeiro acorde de um rock pesado, começou a ver seus amigos baterem cabeça que nem uns idiotas. E o que dizer então do primeiro convite para jogar porradobol?

segunda-feira, 13 de julho de 2009

“Hypael” Jackson


Eu sei que o que vou falar é meio óbvio. Mas aqui vai só para constar: bastou o Michael Jackson morrer, para rolar o maior “hype” em cima da obra dele. Sábado mesmo, eu estava num casamento pra lá de popsônico e todas as três vezes em que alguma música do “Rei do Pop” tocou, a pista simplesmente bombou. Eram velhos, jovens e crianças, todos correndo para se sacolejar – e fazer o moonwalk (isso talvez seja o pior) - ao som de Beat It, ou Bad, ou Don’t Stop ‘Till You Get Enough.

Domingo, estava num restaurante e vi um grupo de pessoas conversando sobre o “Maicon” também. E aí, notei o poder de um artista tão gigantescamente popular: todos contavam algumas de suas experiências ao som do “Rei do Pop”, como se reivindicassem para si a exclusividade da intimidade com o ídolo. O pior é que, uma hora, o papo passou a ser sobre os 50 anos de carreira do Roberto Carlos e, no final, eu não sabia nem mais de qual Rei – o do Pop ou o da Jovem Guarda – eles estavam falando.

Bom, mas o fato é que Michael Jackson se foi e, agora, todos sentem falta dele – mesmo que não dessem a mínima bola para o que o ídolo estivesse fazendo musicalmente nos últimos 20 anos. É a tal necrofilia da arte, que “valoriza” a obra do artista depois de sua morte.

Até eu já sofri isso na pele, de uma forma muito louca e numa escala milhões de vezes menor. Quando a minha pequena e desconhecida ex-banda acabou, fui abordado por um amigo que me disse achar “deprê” o fim do grupo. Eu resolvi retrucá-lo: – Poxa, mas você nem ia mais ao nosso show. Que diferença faz? Ele, então, reconheceu que eu havia colocado um “ponto interessante”.

Ou seja, muitas vezes parece que lamentamos o fim somente por ele representar... o fim – não importa de quê, exatamente. Eu mesmo me incluo neste grupo dos que gostam que as “coisas estejam sempre à disposição”.

Por último, permitam-me cometer uma heresia neste momento de comoção e confessar-lhes: – Acho que estou ficando meio de saco cheio desse papo de Michael Jackson. Simplesmente, cansou. Não quero saber o que vão fazer com o dinheiro dele, o que vai acontecer com os filhos, nem se ele tomou remédios demais ou de menos. Ah, e o mais importante: não agüento mais ver tentativas de moonwalk nas pistas de dança!!!

Já que o enterro demorou tanto para acontecer, bem que podiam ter sepultado esse oba-oba junto com o corpo do “Rei do Pop”.

sábado, 11 de julho de 2009

Dica de programa: Green Folkies no Cornhills Café


A minha dica de programa para a noite deste sábado (11) é o show da dupla Green Folkies no Cornhills Café, que fica na 202 sul. Desta vez, não poderei assisti-los, pois tenho um casamento muito descolado para comparecer no mesmo horário (20h). Mas já fui há algumas apresentações deles e posso garantir que são ótimas.

O Green Folkies é formado por Fernando Brasil (violão, gaita e voz) e Flávio Pennachio (violino e banjo) e, como o nome antecipa, traz um repertório calcado em artistas folk (Bob Dylan, Donovan, Johnny Cash, Neil Young e Simon & Garfunkel) ou em versões em violão, violino e voz para roqueiros britânicos (Beatles, Stones, Van Morrison, etc).

Fernando Brasil, figura conhecida principalmente por seu trabalho à frente do Phonopop, é apontado por muitos como o melhor vocalista da geração 2000 do rock brasiliense. Na verdade, talvez seja o único que mereça o rótulo de cantor - um verdadeiro crooner!!! - por sua excelência vocal. Além disso, é um ótimo guitarrista, melodista e profundo conhecedor do rock dos anos 60, principalmente a vertente britânica. Ele utiliza essas ferramentas para montar um repertório diferenciado, que une de forma inteligente artistas americanos e ingleses; antigos e novos (no show rola até os "mudernos" The Fratellis).

Flávio Pennachio é uma espécie de “Stephanie Grappelli do cerrado”, pois utiliza o violino com trejeito popular e até jazzístico, sem se apegar tantos aos classicismos ligados ao instrumento. Ao longo do tempo, ele foi ganhando desenvoltura como solista (hoje, o repertório da dupla conta até com música instrumental), e passou também a tocar banjo e pandeiro.

Para quem acompanha o trabalho do Green Folkies desde o começo, dá para sentir que a dupla está cada vez mais afiada e o seu show, dinâmico. Esse aprimoramento tem os feito conquistar um grupo fiel de admiradores, nos quais se incluem desde amigos próximos até o fenômeno teen Mallu Magalhães.

Mas a inusitada história de como a Mallu Magalhães conheceu e caiu em elogios ao som do Green Folkies, só os integrantes da dupla podem contar...

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Ramones em Brasília? Eu Vou — A Farsa


Confesso que demorei a entender o nome da festa que trará a apresentação de CJ Ramone & banda para Brasília. Depois um tempo é que a ficha caiu. Ah, os organizadores então querem maquiar, fingir que isso é um show do Ramones, talvez para enganar as pessoas desinformadas, que ainda não sabem que os três membros principais da banda já foram dessa para melhor!!!

De qualquer forma, continuo achando bizarro o nome “Ramones em Brasília? Eu vou – A Festa”. Do alto da minha ignorância publicitária, achava que bastava divulgar o show como CJ Ramone & banda — e, simplesmente, informar no subtítulo que o cara tinha sido baixista da lendária banda punk novaiorquina.

Mas não. Eu estou a anos-luz de entender o que é uma boa divulgação e, por isso, nunca inventaria o nome “Ramones em Brasília? Eu Vou – A Festa”. O pior é que, por curiosidade, talvez eu compareça ao evento, já que ouvi dizer que o baterista é ex-membro do Kyuss e do Queens of the Stone Age e o guitarrista é Daniel Rey, produtor de vários discos do Ramones.

Mas, sinceramente, dá até desânimo ir num show que se chama “Ramones em Brasília? Eu Vou – A Festa”. O pior é que, como a cidade onde moro é um ovo, é bem capaz de eu conhecer algum produtor do evento. Poxa, se isso rolar, já peço desculpas de antemão. Mas entenda, meu caro amigo, eu não poderia deixar de sacanear um evento que se chama “Ramones em Brasília? Eu Vou — A Festa”.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Mais Hüsker Dü





Continuando no tema Hüsker Dü, segue um texto que o amigo Júnior Elcio, também grande fã do trio de Minneapolis, escreveu há alguns anos para o site Alucináticos, mas que acabou nunca sendo publicado. Por apresentar um enfoque mais minucioso e informativo, acredito que ele complete bem as lacunas deixadas pelo meu relato. O legal é que, apesar de trilharem caminhos diferentes, os dois textos acabam convergindo em diversos pontos.

Prometo que, depois dessa overdose de Hüsker Dü, não escrevo mais nada sobre nenhum artista de Minneapolis — com exceção de Replacements e Prince, talvez (rs).


HÜSKER DÜ - VOCÊ SE LEMBRA?

Alguns anos antes de cometer suicídio, Kurt Cobain mencionou em uma entrevista que uma de suas influências musicais era uma banda de Minneapolis chamada Hüsker Dü. Foi o bastante para que um dos grupos mais influentes e importantes do rock underground norte-americano tivesse sua obra redescoberta e ficasse um pouco mais conhecido do grande público — e principalmente da "pequena crítica"...

Para quem não conhece ou não se lembra, o Hüsker Dü foi formado em 1979 pelo guitarrista e vocalista Bob Mould, pelo baterista e também vocalista Grant Hart e também pelo baixista Greg Norton. Foi uma banda inovadora e muito influente no som que se ouve em grupos que surgiram nos anos 90 e até hoje em dia. Viraram meio que um mito pelo que realizaram musicalmente. O trio ajudou a mudar a direção do rock and roll alternativo de um modo estrutural, mesmo nunca se mostrando uma banda extremamente conhecida. Ao longo de seus quase nove anos de existência, eles poliram um punk rock/hardcore primal até chegarem em um estilo que, na época, não tinha classificação (como as inúmeras que vemos hoje em dia). Eles souberam mesclar peso e melodia como ninguém e seus discos influenciaram bandas como Pixies, Superchunck, Soul Asylum, Replacements, além da já mencionada Nirvana. Dizem até que o H.D. seria uma das bandas seminais do famigerado movimento Emo (Emotional Hardcore), mas essa heresia é uma das maiores cretinices já ditas sobre essa ótima e pouco conhecida banda.

O Hüsker Dü foi a primeira banda alternativa a assinar com uma gravadora grande e são lembrados por terem feito isso também sem se deixarem manipular ou perder o controle criativo por pressões de vendagem. Nunca aliviaram pra ninguém, nunca comprometeram suas composições. Acreditaram na música que faziam e isso foi o bastante.

Em 1979, Bob Mould cursava universidade e trabalhava numa loja de discos quando conheceu Grant Hart e Greg Norton. Os três tinham influências musicais diferentes, mas compartilhavam o gosto pelo hardcore e punk rock.

Mould e o baterista Hart — coisa não muito comum, diga-se — combinaram suas habilidades de compor, tocar e cantar composições com melodias consistentes, muitas vezes seguindo estruturas usadas em canções pop, mas que não deixavam de ser punk rocks originais.

Em 1981, o trio lançou seu primeiro single "Statues" por um selo local. Logo em seguida, saiu seu primeiro disco "Land Speed Record". Gravado ao vivo, contém 17 porradas sonoras. Mais tarde, naquele mesmo ano, saiu "In a Free Land", tão pesado e rápido quanto o anterior. Em 1982, veio "Everything Falls Apart", o primeiro álbum da banda gravado em estúdio. Nessa época, o grupo começou a viajar incessantemente pelos EUA, tocando em pequenos lugares. Juntamente com bandas como Minutemen, R.E.M., Black Flag e The Meat Puppets, o Hüsker Dü formou um núcleo de bandas independentes que conquistaram fama por excursionarem incessantemente e assim tendo seus discos tocados em inúmeras rádios universitárias.

Depois do lançamento de "Metal Circus" em 83, o H.D. se desenvolveu musicalmente em um ritmo veloz com Mould e Hart como compositores e vocalistas no disco lançado em 1984, o elogiadíssimo "Zen Arcade". Este foi um álbum duplo - algo completamente inovador no chamado underground - e mostrava a banda em um momento de ampliação de seus horizontes musicais, apresentando canções mais afiadas e dando mais a atenção e espaço para estrutura instrumental além da busca de elementos para sair do padrão "guitarra-baixo-bateria". Um bom exemplo disso é a faixa "Hare Krsna", onde a parte instrumental hipnótica é preponderante e mostra bem a habilidade de composição e principalmente o poder sonoro do Hüsker Dü.

Nessa época, Bob Mould e Grant Hart começaram a desenvolver uma rivalidade interna na banda e também uma perigosa dependência de álcool e drogas. Mesmo assim, o grupo lançou dois discos em 1985: "New Day Rising" e "Flip Your Wig", que foram bem assimilados por público e crítica. O primeiro mostra o trio produzindo canções pop, mas de peso constante, e o segundo, por sua vez, é considerado o trabalho mais acessível do H.D., entretanto sem ter feito concessões ao mainstream da época.

Após o lançamento de "Flip Your Wig", o Hüsker Dü se tornou a 1º banda pós-punk independente do início dos anos 80 a assinar contrato com uma major, no caso a Warner Brothers. O bom "Candy Apple Grey" saiu em 1986. Durante esse mesmo ano, a tensão entre Mould e Hart aumentou. Mould iniciou um processo de desintoxicação, porém Hart piorou seu estado ao aumentar seu abuso de álcool e drogas, chegando a se viciar em heroína. Mesmo assim, eles conseguiram gravar outro álbum duplo: "Warehouse: Songs and Stories", de 87, sendo considerado pela crítica um dos melhores trabalhos da banda.

Nesse ano, a banda se preparava para mais uma série de shows de divulgação do álbum recém-lançado quando seu empresário, David Savoy, cometeu suicídio na noite anterior ao início da excursão. Mesmo assim, a banda optou pela turnê, mas a morte de Savoy foi a gota d'água nos problemas internos que não se resolviam. Após os shows de divulgação do álbum "Warehouse", o grupo não fez mais apresentações naquele ano iniciando rumores que logo poria fim a sua atividade musical. Em janeiro de 88, o baterista Hart foi "saído" da banda e assim o Hüsker Dü acabou.

A antiga edição da revista brasileira Bizz cobriu um show dos em 1987. Eles mal se dirigiam à platéia e emendavam suas composições umas atrás das outras. Isso não impedia que tocassem covers como "Sheena is a Punk Rocker" dos Ramones ou "Eight Miles High", do Byrds. Era "música pela música" e somente isso. Mas o que mais impressionou o jornalista na época foi o fato de, após um show arrasador, Mould, Hart e Norton estarem na saída esperando para cumprimentar e agradecer a presença do público. Atitude essa talvez fruto de uma época e coisa que não se vê muito hoje em dia...

Em matéria de vídeos, o Hüsker Dü não poderia ser mais fiel a suas gravações de áudio: registros toscos em vhs, vídeos semi-amadores, com exceção do hit "Could You Be The One", melhor produzido, é verdade, mas que mostra o trio tocando em um cenário comum com projeções de luzes coloridas. E por mais paradoxal que seja, toda essa "produção" foi capaz de captar banda em seu em estado bruto. Um primor de simplicidade e, por isso mesmo, brilhante.

Bob Mould é um caso a parte. Um guitarrista talentoso, mas, acima de tudo, um excelente e prolífico compositor e letrista. Com o entrosamento e o peso que Grant Hart e Greg Norton ofereciam, seus riffs marcantes e uma expressiva noção de melodia, compôs prolificamente nos anos de banda e após. Logo depois da separação, Mould desenvolveu uma criativa carreira-solo lançando dois álbuns: "Workbook" (que tem uma faixa com o curioso nome de "Brasilia Crossed With Trenton") e "Black Sheets of Rain". Depois formaria a banda Sugar em 1992, lançando dois ótimos discos: "Copper Blue" e "File Under: Easy Listening". A (boa) banda Sugar acabou em 95 e Mould voltou a sua carreira-solo.

Grant Hart, compositor e letrista eclipsado pela “fama” de Mould, lançou dois álbuns-solo após o término do Hüsker Dü e somente depois de controlar seu vício, montou uma banda - Nova Mob - que lançou dois discos, o último em 1994. E o baixista Greg Norton, que sempre usou um vistoso bigode bem no estilo daqueles mestres-cucas caricatos, prosaicamente, virou chefe de cozinha (!!!)

Ouvir a obra do Hüsker Dü é entender melhor o som que é feito hoje em dia, e ainda, anunciado como novidade extrema. E, ao mesmo tempo, conhecer músicas que podem parecer datadas, mas, ao se prestar bem atenção, são, na verdade, composições atemporais. É como se você ouvisse hoje pela primeira vez e pensasse: "Isso parece com alguma coisa... eu já ouvi algo parecido... eu lembro disso..." Só que "isso" foi feito 10, 15 anos atrás e, de algum modo, perdura até hoje. Uma curiosidade: o nome da banda foi tirado de um jogo de trívia dinamarquês dos anos 50 e ironicamente significa exatamente isso: “Você se lembra?”

Hüsker Dü. Ainda hoje, você se "lembra" ?

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Tese Hippie + Antítese Punk = Síntese Hüsker Dü


Um dos meus vários projetos que nunca saíram do papel foi um trabalho final da faculdade de jornalismo, no qual eu propunha estudar a história do rock por meio das capas de disco. Cheguei a preparar pré-projeto e encontrar um orientador, mas a falta de um recorte adequado, somado à ausência de conhecimento teórico na área de artes plásticas e à ansiedade de sair o mais rápido possível da universidade, fez a idéia naufragar. Acabei trocando-a por algo muito mais nobre e excitante intelectualmente: um jornalzinho para o bandejão da universidade, em parceria com um amigo. Professores da banca fingindo-se não enganados daqui, alunos fingindo-se não enganando de lá, o que importa é que me formei, depois de cinco anos e meio com a mesma pergunta na cabeça: - O que estou fazendo nesta m*?

Voltando ao meu projeto imaginário, cheguei a pensar em várias imagens que poderiam ilustrar a minha teoria. Um dos objetos de estudo já estava demarcado: a capa do disco Warehouse: Songs and Stories, do Hüsker Dü. Além de ser escolhida pelo imparcial critério da admiração artística, ela entrou no meu projeto - mental, é sempre bom lembrar - por se encaixar como uma luva na base teórica do meu estudo: a Dialética Hegeliana (atualizada para “dialógica” pelo meu orientador), na qual toda tese gera uma antítese, as quais, somadas, dão origem a uma síntese.

(Abre parênteses: agora, acho que agora me excedi. Quem quiser parar de ler o texto neste momento, tem todo o direito de fazer isso. Fecha parênteses).

No caso, a tese seriam as capas e cartazes coloridos, com toques oníricos, de bandas psicodélicas do final dos anos 60 (Beatles, Pink Floyd, Byrds, Grateful Dead, Jefferson Airplane e outros) e a antítese, as capas chapadas, muitas vezes em preto e branco, serigráficas, quase em formato jornalístico, dos grupos punks do final da década seguinte (Clash, Sex Pistols, Buzzcocks, The Jam e outros). A capa e a contracapa de Warehouse: Song and Stories, embora tragam o colorido psicodélico, não caminham tanto para o lado “sonhador” dos grupos dos anos 60, mas para algo mais decadente, pessimista, típico do fim da era Reagan — num clima bem “It’s the End of the World as We Know It (and I Feel Fine)”, profetizado pelo colegas de underground R.E.M na mesma época.

O mais legal é que essa opção gráfica expressa perfeitamente o que é o som do Hüsker Dü: a banda que deixou para trás a tônica de protesto social punk e passou a falar de sentimentos profundos, confusos; que trouxe a melodia para um movimento que se pautava quase que exclusivamente pela agressividade sonora. Como todo artista em processo de amadurecimento, essas características foram surgindo ao longo da carreira da banda, que começou tosca, rápida e pesada (no álbum Land Speed Record, de 1981), mas foi flertando aos poucos com o “flower power”, em músicas como Hare Krsna (do clássico Zen Arcade, 1983) ou na versão para o marco zero do psicodelismo: Eight Miles High, do The Byrds. O álbum Warehouse: Songs and Stories é, portanto, o ápice desse amadurecimento, quando a banda já tinha encontrado a sua marca e tava cheia de moral no circuito independente norte-americano.

Lembro-me da primeira vez que vi a capa desse disco: no verão de 1989, fui passar férias em Recife, na casa de um amigo que trabalhava na loja de discos Allegro Cantante. Numa das minhas visitas à loja, ele me mostrou o disco daquela banda que tocava Don’t Wanna Know If You Are Lonely (do álbum Candy Apple Grey, de 1986), única música que eu conhecia deles até então. Confesso que, ao me deparar com a foto do Hüsker Dü na contracapa, fiquei decepcionado: os caras usavam roupas do dia-a-dia, sendo que deles estava sem sapato e vestindo camisa rosa e o outro usava um bigode à Salvador Dali. Poxa, até aquele momento, do alto dos meus 15 anos, eu achava que um cara que tocava sons mais rápidos tinha que se vestir com jaqueta de couro preta, ou com roupas rasgadas ou, pelo menos, usar uma bandana na cabeça. Aquela simples foto de contracapa acabara de abalar parte das minhas crenças musicais, trazendo uma sutileza que eu ainda não era capaz de apreender.

Para reforçar essa confusão, lembro que, um pouco depois de ver aquela chocante foto da contracapa, li uma matéria na revista Bizz que continha um trecho mais ou menos assim: “ (...) e bandas inclassificáveis como Hüsker Dü e New Model Army”. Caramba, como assim? Como uma banda pode não ter classificação? Existem tantos rótulos no rock (punk, pós-punk, psicodélico, hardcore, hard rock, etc) e essas bandas simplesmente não se encaixam em NADA?

O mais interessante é que essa sonoridade do Hüsker Dü acabou sendo uma das grandes influências para grunges e indies da década seguinte, revelando que, na verdade, o trio de Minneapolis estava à frente do seu tempo. Do meu lado, o que posso dizer é que aquela decepção que tive aos 15 anos, ao olhar para a foto da contracapa de Warehouse, só foi se transformando, com o tempo, em admiração. Se em algum momento, a síntese proposta por aquela banda não rotulável abalou o meu eixo, em outro, tornou-se parte do meu norte.

PS: Acabei me atendo tanto a essa questão da capa, que não falei muito do lado sonoro do disco. Warehouse é um álbum produzido a partir do talento e do duelo de egos dos compositores e vocalistas da banda, o guitarrista Bob Mould e o baterista Grant Hart. Acabou se tornando um disco duplo, recheado de belas canções pop, exatamente para aliviar a disputa de espaço entre os dois. Apesar da excelência nas composições, o Hüsker Dü tinha um ponto fraco: eles eram péssimos em estúdio, o que faz com que a qualidade de gravação de todos os seus discos estejam entre as piores do rock!!!

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Edgard no Ar – Forgotten Boys, Retrofoguetes e Lanny Gordin


Nesta terça à noite, ao chegar em casa, liguei a TV e vi que estava passando o programa Edgard no Ar, no Multishow. As atrações eram os paulistas do Forgotten Boys, os baianos do Retrofoguetes e a lenda da guitarra Lanny Gordin, que, entre importantes trabalhos com os tropicalistas, gravou o disco Fa-Tal, da Gal Costa, e ainda tocou com o Hermeto Pascoal.

Essa é a terceira edição que assisto do programa. Já tinha visto um com Móveis Coloniais de Acaju e Macaco Bong e outro com Nação Zumbi e Curumim. O formato é interessante: pautado no inglês Jools Holland, no qual os convidados se apresentam lado a lado, contando, às vezes, com a participação do apresentador. O som, a propósito, é muito bem equalizado, coisa rara na TV brasileira até pouco tempo atrás. Um dos pontos que ajuda nesta qualidade sonora é o próprio aprimoramento dos equipamentos das bandas brasileiras. Se hoje é possível encontrar amplificadores Orange no palco, antes o que reinava era o famigerado Jazz Chorus, da Roland.

Mas voltando à edição de ontem, a banda que mais gostei foi o Retrofoguetes, principalmente pelo ótimo guitarrista Morotó Slim. Ele e o também excelente baterista Rex são ex-membros do Dead Billies, banda responsável por um dos melhores shows que já vi no circuito independente brasileiro (Goiânia Noise, 2001). O legal de assistir ao Morotó tocando é notar o domínio que ele tem da guitarra de rockabilly e surf music, frutos de dedicação e alguns anos de estrada. As composições também são boas, fugindo do lugar comum prevalecente no gênero.

As únicas derrapadas do Morotó foram nos covers. O primeiro foi Stray Cat Strut, do Stray Cats, em que ele engasgou nas últimas frases do solo. Neste ponto, vale ressaltar o quanto as frases do Brian Setzer são difíceis de serem tocadas. Eu arriscaria dizer que nunca vi um guitarrista brasileiro tocar bem Stray Cats, até porque, em certos aspectos, a guitarra de Brian Setzer está num grau de dificuldade maior do que a do Jimi Hendrix.

A outra derrapada do Morotó foi no solo de Sunshine of Your Love, do Cream. Na verdade, o solo dele não chegou a ter notas erradas, mas deu para notar que os longos bends do blues não eram o seu forte. Um cara perfeito para tocar essa música seria o canhoto Gabriel Guedes, do Pata de Elefante, que entende do riscado quando o assunto é Eric Clapton.

Aliás, já que estamos falando em grandes guitarristas, vale a pena citar a participação especial de Lanny Gordin no Edgard no Ar. Ele tocou uma música que acredito ser de sua autoria, junto com os competentes Os Wilsons, banda de apoio do Edgard, e mandou uns solos atonais/dissonantes de fazerem inveja a Vernon Reid (Living Colour) e Lee Ranaldo (Sonic Youth). O que dá para notar é que, embora não esteja 100% em forma, Lanny Gordin é dono de uma musicalidade realmente diferenciada. O solo dele em Sunshine of your Love foi dos mais malucos que ouvi recentemente.

A terceira e grande atração da noite foi o Forgotten Boys, grupo atuante na cena independente paulistana e brasileira. Acho-os competentes, mas um pouco "mascarados". E esta característica, na minha opinião, acaba afetando o som deles, pois parece faltar-lhes uma certa "entrega" à música. O resultado sonoro, então, fica mais próximo do que deveria de suas influências (Rolling Stones e bandas proto-punks). E o pior (ou melhor) é que o guitarrista e vocalista Gustavo e o baixista Zé parecem ser bem ligados em música, conhecedores mesmo. Ou seja, potencial não lhes falta.

Um último ponto que eu gostaria de ressaltar é que o Edgard está aparecendo demais. Nesta edição, cantou três covers (ainda rolou Hound Dog, do Elvis Presley), enquanto só ouvi cada atração tocar uma música. Tudo bem que ele parece se esforçar para pegar as músicas, que são até bem escolhidas pela produção, de acordo com as atrações. Mas a impressão é que o programa está mais centralizado nele do que deveria. Se continuar assim, corre o risco de virar um Jô Soares dos programas de música.

Para quem quiser assistir a esta edição do programa, ela ainda passará nesta quinta (2), às 13h; na sexta (3), às 01h e às 07h30; no sábado (4), às 18h, e na segunda (6), às 8h.